Quando Buda me fez chorar
quinta-feira, agosto 03, 2017Foto por Silentpilot |
Quem me conhece geralmente me acha uma pessoa fácil de conviver. Não estou falando isso como quem está se exibindo, apenas é essa a imagem que eu passo. Se eu não consigo trazer algo de produtivo, faço o máximo possível pra não causar dano a ninguém. Apenas não deixar ninguém pior do que estava quando cheguei. Penso que isso é o melhor que eu posso fazer, por qualquer um. Isso significa que é raro eu ser dura ou grossa com alguém — se fui, ou foi sem intenção, ou não estava bem. Conscientemente evito trazer mais sofrimentos, por que acho que as pessoas já sofrem demais. A vida que cada um leva é sofrimento suficiente.
Em contrapartida, eu sou geralmente meu carrasco. Nunca perdoo meus erros: carrego eles comigo e me lembro até mesmo das coisas mais simples que fiz de errado. Sempre exijo demais de mim: tudo que faço tem de chegar o mais próximo possível da perfeição. Estou sempre me criticando e me colocando pra baixo, mesmo sabendo que estou fazendo meu melhor. É como se eu tivesse uma vozinha na minha cabeça que pega o pior de mim, ainda que seja algo mínimo, transforma aquilo num monstro e esfrega na minha cara. De todas as pessoas que me trazem problemas, eu sou a pior delas. Meu inferno sou eu mesma. Estou sempre ocupada lidando comigo.
Um dia estava navegando no Pinterest, que às vezes me sugere algumas imagens relacionadas a filosofia budista. O Budismo é uma das poucas filosofias que não só tenho interesse em me aprofundar de verdade, como também é uma filosofia que está sempre mudando minha forma de ver as coisas, e aquilo que coloco em prática. Eu gosto, e acho que se encaixa na minha visão de mundo. Como estou sempre salvando algumas frases budistas na minha pastinha, é natural que o Pinterest use seu algorítimo pra me fazer salvar mais imagens. Nesse dia, essa imagem apareceu:
"Se sua compaixão não inclui você mesmo, ela é incompleta" |
Eu nem mesmo precisei pensar a respeito do que estava lendo. Não foi necessário. Tão logo terminei de ler a frase, as lágrimas começaram a descer em cascata. Percebi o que estava fazendo e isso foi doloroso. Passei a madrugada toda chorando, e no outro dia, não conseguia esquecer o que li. Ficou martelando na minha cabeça, durante a aula, durante o caminho pra casa, durante o almoço, o banho... Comecei a perceber que, por mais que tentasse trilhar um caminho espiritual, não chegaria muito longe se eu não me incluísse nele, e se esse caminho não servisse pra mim. Na verdade, enquanto eu fizesse uma diferenciação entre "eu" e "os outros" ficaria rodando em círculos nesse caminho. Você não poderia considerar uma pessoa verdadeiramente paciente se ela deixa de ser paciente com alguém, mesmo que esse alguém seja ela mesma. E isso inclui todas as outras características que tentamos melhorar.
Algumas semanas depois, um amigo me deu um conselho — na verdade uma bronca — que complementou a frase. Na verdade, foi a bronca dele que me fez entendê-la por completo. Ele me criticou por eu mesma me criticar, deixando bem claro que eu sou uma pessoa como qualquer outra, sujeita a passar pelo que todos os outros passam — e cometer os mesmos erros que eles. Foi doloroso ouvir isso, mas também necessário. Por mais estranho que possa parecer, me fez abrir os olhos para o que estava bem óbvio: eu nunca trataria nenhum dos meus amigos da forma como eu trato a mim mesma. Nem mesmo consigo me imaginar direcionando aos outros as mesmas palavras que uso para mim. Não combina comigo. Não faz parte de como eu quero passar por esse mundo.
Tive que começar um doloroso processo de perdoar a mim mesma. Um processo nada fácil e que não posso dizer que está terminado: cada dia um erro "imperdoável" aparece, cada dia me sinto menos digna de receber o tratamento que daria a qualquer um, cada dia a vozinha aparece me dirigindo palavras duras que eu preciso lutar para não aceitar como verdade. Mas estou fazendo o meu melhor, tentando ser para mim o que geralmente sou para os outros: uma amiga, disposta a ajudar, disposta a ouvir, fazendo o possível pra não deixar as coisas pior do que estavam. Reconhecer que temos qualidades também não é fácil, tem sempre aquela parte de si mas faz parte do processo. Chegarei lá.
11 comentários
acredito que isso faça parte de um processo de autoaceitação, defeitos ou qualidades, só aceitando nossas sombras para sermos capazes de modificá-las. (a teoria é tão fácil)
ResponderExcluirem minha jornada tive que reconhecer que o perdão está intimamente ligado a humildade, pedir desculpas e reconhecer que estamos errados é um aspecto importante para nós mesmos, ainda me martirizo por coisas tolas, até porque não é fácil mudar.
espero que cada vez mais consiga se incluir em sua compaixão, acho que só assim podemos chegar mais perto de... como é que os outros falam? ser feliz?
Oi Gustavo, bem vindo!! rsrs ♥
ExcluirAcho que você tem razão quando fala que está ligado a humildade, a gente precisa ter humildade de entender que podemos também ser pequenos, que também podemos errar.... também somos humanos, afinal.
É um longo processo né. Não sei se a gente fica mais perto da felicidade, mas pelo menos evita sofrimento desnecessário. Já é alguma coisa rs
Obrigada pela visita e pelo carinho, fiquei muito feliz de te ver comentando aqui hehe' <3
Bjs!
Você se cobra muito e se coloca pra baixo, quando na verdade é uma pessoa incrível, sensível e maravilhosa! Seu amigo está certo e a frase do Buda também, inclusive também preciso dela na minha parede :c
ResponderExcluirCom amor,
♥ Bruna Morgan ♥
Que fofa você! rs' Muito obrigada pelo carinho, você é também é uma mulher incrível, sensível e maravilhosa, vejo muita poesia nos seus textos e desenhos. Só mesmo uma pessoa muito especial pra fazer uma arte tão bonita ♥
ExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirEu te entendo sobre esse pessimismo quanto a nós mesmos. Mas venho também tentando lutar contra isso, toda vez que a voz na minha cabeça diz "Você não vai consiguir" , eu digo: " vou conseguir sim, e se eu não conseguir foda-se pelo menos tentei." . Assim como temos que ligar o 'dane-se' sobre as opiniões ruins dos outros sobre nós, também temos que lutar contra essa voz ruim na nossa cabeça. Não é fácil, mas também não é impossível. Quanto ao reconhecimento das nossas qualidades, nós vamos chegar lá sim, com muita luta, com otimismo, mas iremos chegar.
ResponderExcluirXoxo♥
Às vezes essa "voz ruim" é pior que a opinião dos outros, nós mesmos nos trazemos muita dor e sofrimento, e nem sempre com algum fundamento. Como você disse, lutar contra isso não é fácil, mas também não é impossível. A gente precisa lutar com unhas e dentes por nós mesmos rs'
ExcluirPrecisamos ser gentis conosco. Não adianta ser legal com o coleguinha e se sentir um cocô mole por dentro. A gente precisa aprender a se perdoar e saber que todo mundo erra, e fazemos parte desse todo mundo. Não sou a maior fã de budismo, mas gosto dessa vibe que eles têm. É importante.
ResponderExcluir;*
Disse tudo! Eu gosto demais dessa vibe, me faz bem :)
ExcluirSempre que posso estou em busca de conhecer mais o budismo, conhece a monja Coen? Ela é uma das minhas fontes de inspiração budista. Já sofri muito com o costume de me cobrar além do normal, de querer fazer o trabalho perfeito, de ser sempre a melhor. Muitas vezes acaba me comparando com as outras pessoas, julgando que elas sempre faziam um trabalho melhor que o meu. Tenho melhorado muito com isso, tenho ido em busca do que seja suficiente, nem perfeita nem ruim, o suficiente para entregar meus trabalhos na universidade, para escrever meus textos. Espero que você se olhe no espelho e comece a enxergar a quantidade de qualidades que você tem, foco no que te há de bom e não o que não saiu como planejado. Você escreve muito bem viu? Estou apaixonada pela tua escrita. Se valorize mais e coloca essa voz de erros imperdoáveis no modo mudo.
ResponderExcluirBeijos
Siiim!!! Já vi vários vídeos dela. Acho a voz dela extremamente doce e calma, mesmo que às vezes eu não coloque nada do que ela diz em prática, só a voz já me tranquiliza ♥
ExcluirEssa coisa de se cobrar/comparar é muito doloroso né, até porque nós sempre colocamos mais peso naquilo que fazemos. O "nosso" é sempre pior. Eu estou tentando simplesmente aceitar que eu não sou perfeita e não tenho como ser. Como você disse, tentar ser o suficiente, aquilo que eu consigo fazer, dentro das minhas capacidades.
Muito obrigada pelo carinho! Prometo que vou tentar <3
Beijos!
Leio tudo com carinho e respondo sempre que posso.
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