— Sabe, eu me sinto muito sozinho.
— Sozinho?
— Sim, sozinho. Não "sozinho" como se eu sentisse falta de ter alguém pra conversar e desabafar, mas "sozinho" de uma forma diferente.
— Você pode me explicar melhor?
Suspiro.
— É difícil explicar... É como se... eu tenho essa sensação de que estou sozinho, mas não sinto falta das outras pessoas, é como se eu estivesse em uma bolha, ou fosse uma ilha. As outras pessoas estão por aí, sonhando e vivendo, e eu me sinto a margem de tudo isso. Tento me aproximar delas e elas tentam se aproximar de mim, mas ainda assim, não consigo integrá-las ao meu mundo. Eu sinto que estou vivendo separado de tudo isso, como um caso a parte, e tenho alguns momentos de interação com outras pessoas. Eu tento construir uma ponte entre mim e os outros, mas parece que nada funciona. Eu continuo sendo uma ilha, isolada, vivendo a minha vida, enquanto as outras pessoas estão integradas vivendo a vida delas, e meus planos e sonhos, meus medos e frustrações continuam se mantendo em segredo comigo, e o mesmo acontece com elas. Eu sou uma ilha vivendo numa multidão de pessoas, e isso é muito difícil.
— ...
— Tudo acontece rápido demais. Não consigo entender onde estou ou porque estou aqui, não vejo sentido em nada disso. Me sinto como uma criança que foi forçada a participar de uma brincadeira que ela não conhece as regras, e não pode mais parar de brincar. Sou alguém que não jogava e foi acrescentado ao jogo, mas que não devia estar no campo... E então, tudo acontece muito rápido, mais rápido do que eu me dou conta de acompanhar. O mundo parece estar me invadindo. Tantas informações, tantas pessoas, tantas coisas para fazer... Tem dias que eu só quero chegar em casa e ficar dentro do meu quarto, sem ver a luz do sol pelo resto do dia. Mas então, eu preciso sair, ver meus pais, meus amigos, estudar, trabalhar, comprar leite que falta na geladeira, assumir responsabilidades... Pra que? Por que? Quem determinou?
— As coisas sempre foram assim...
— Por que todo mundo tem que fazer parte? Eu só preciso ter um momento sozinho, pra recarregar minhas energias, mas eu não consigo. Não consigo recarregar minhas energias. O mundo... o mundo me deixa exausto. Eu estou exausto.
— Certo. Mas você não vê nada de bom nisso tudo?
— Eu não posso dizer que não vejo... Tem tanta coisa bonita lá fora. As árvores e as flores, prédios construções antigas... Eu gosto de tudo isso. Gosto das pessoas também, de suas diferenças, de seus sonhos, e de falar com elas. Mas isso não quer dizer que eu não me canso, que isso não me deixa exausto e que a coisa mais simples me parece exigir um esforço enorme. Eu só queria ser como as outras pessoas, conseguir levantar e funcionar sem ter de carregar um mundo nas costas. Mas não sou assim, e tem dias... tem dias que tudo parece tão difícil...
— Eu entendo.
— ...
— Vai ficar tudo bem.
— Eu sei.
— Você não precisa enfrentar isso sozinho.
Risadas.
— Ninguém nunca vai entender como eu me sinto.
— Vai sim, acredite.
— Como você pode dizer isso?
— Há outros como você.
— ...
— E eles também se sentem sozinhos. Muita gente se sente sozinha.
— Mas é diferente.
— Eu sei. Mas ainda assim vai ficar tudo bem.
— Eu espero que sim.
- quinta-feira, setembro 29, 2016
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