Sociedade do Cansaço - Byung-Chul Han

sexta-feira, agosto 30, 2019

Autor: Byung-Chul Han
ISBN: 8532649963
Editora: Vozes
Páginas: 136
Sinopse: Os efeitos colaterais do discurso motivacional O mercado de palestras e livros motivacionais está crescendo desde o início do século XXI e não mostra sinais de desaquecimento. Religiões tradicionais estão perdendo adeptos para novas igrejas que trocam o discurso do pecado pelo encorajamento e autoajuda. As instituições políticas e empresariais mudaram o sistema de punição, hierarquia e combate ao concorrente pelas positividades do estímulo, eficiência e reconhecimento social pela superação das próprias limitações. Byung-Chul Han mostra que a sociedade disciplinar e repressora do século XX descrita por Michel Foucault perde espaço para uma nova forma de organização coercitiva: a violência neuronal. As pessoas se cobram cada vez mais para apresentar resultados - tornando elas mesmas vigilantes e carrascas de suas ações. Em uma época onde poderíamos trabalhar menos e ganhar mais, a ideologia da positividade opera uma inversão perversa: nos submetemos a trabalhar mais e a receber menos. Essa onda do "eu consigo" e do "yes, we can" tem gerado um aumento significativo de doenças como depressão, transtornos de personalidade, síndromes como hiperatividade e burnout. Este livro transcende o campo filosófico e pode ajudar educadores, psicólogos e gestores a entender os novos problemas do século XXI.


Sigo um perfil no Instagram (@startupdareal, para quem quiser conhecer) que indica constantemente esse livro. Estava indo para a aula, de ônibus, sentindo um cansaço que para mim já se tornou comum, e me lembrei da indicação. De alguma forma o título ficou marcado na minha memória, e acabei sentindo vontade de conhecer em profundidade a proposta do autor. Acabei comprando o livro, ali mesmo, no ônibus, e iniciei a leitura. Para mim foi até mesmo um fato engraçado poder comprar um livro e ler assim mesmo, no meio de uma viagem, enquanto eu costumava esperar semanas para o livro chegar. 

O autor escreve sobre nossa sociedade atual, pautada em uma positividade exagerada, e como isso vem contribuindo para o aumento no índice de depressão, hiperatividade, Burnout, entre outros transtornos psicólogos. Ele começa fazendo uma comparação com a sociedade disciplinar de Foucault, uma sociedade que é baseada no controle, na ordem, na vigilância constante das pessoas e de seus comportamentos, que produz corpos dóceis, fáceis de controlar e de fazer produzir. Para o autor, a sociedade disciplinar de Foucault vem se transformando na sociedade do desempenho, um modelo em que nada é proibido, as pessoas possuem uma suposta liberdade de fazer o que quiser, porém, precisam o tempo todo estar produzindo coisas, trabalhando, investindo, empreendendo. A sociedade do desempenho é também marcada pelo excesso de estímulos, informações, possibilidades, em que o tempo ocioso, criativo, de tédio, é repelido. Tudo isso acaba contribuindo para o aumento no número de pessoas com depressão, ansiedade, Bournout, que para o autor, é o completo esgotamento do indivíduo que está sobrevivendo nesse modelo.

Sociedade do Cansaço foi uma leitura mais complexa do que eu esperava. Confesso que, a princípio, e principalmente depois de ver várias reportagens sobre o livro, esperava que tivesse um tom de autoajuda. Mas não tem. E que bom. Apesar de curto, o livro é bastante complexo e profundo, talvez até mesmo difícil para quem não está muito familiarizado com alguns conceitos filosóficos. O autor faz várias citações ao longo do texto, que necessitam de certo conhecimento prévio para entender completamente sua ideia. Apesar de ser complexo, a leitura não é massante ou cansativa, necessitando apenas de um pouco mais de atenção em alguns trechos.

Como psicóloga, fiquei particularmente interessada nos capítulos sobre adoecimento mental. É comum que fatores sociais sejam ignorados quando se fala em adoecimento mental, e por um motivo até mesmo simples: transferindo a responsabilidade pro indivíduo, problemas que são da própria estrutura da sociedade (como exploração no trabalho e serviços precários) permanecem intocados. Isso reflete em falas que vemos por aí que basta querer, se esforçar ou ter pensamentos positivos que se chega em qualquer lugar, inclusive para "superar" uma situação de adoecimento. Claro, as coisas não são assim tão simples, tratar depressão ou Burnout, por exemplo, leva tempo, e um indivíduo adoecido não é "útil" ao sistema. Tampouco é útil o indivíduo que questiona e luta por melhores condições de vida, por isso essa visão não é incentivada. É aqui que entra a visão do autor: aquela pessoa que está focada em seu desempenho, trabalhar muito, estudar, ser fitness, ter um Instagram recheado de eventos bacanas, ter "sucesso", produz muito mais, e diferente de antes, produz pensando em si mesma, explorando a si mesma, não porque vai ser punida caso não faça, mas porque acredita que é o que quer e vai trazer felicidade. 

Diante desse cenário, da sociedade do cansaço, do excesso de cobranças, da positividade tóxica, não consigo deixar de me perguntar, como manter a sanidade diante dessa situação? Como sobreviver, trabalhar e estar inserido nesse sistema, sem deixar se adoecer por ele? Existe algum equilíbrio? Seria maravilhoso ter uma resposta pronta, uma receitinha do que fazer. Mas as coisas não são tão simples assim. De todo modo, a reflexão e o entendimento do que ocorre a nossa volta é necessário. E leituras como essa são indispensáveis. Recomendo muito!

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14 comentários

  1. Oi, Marina!
    Salvei o link da resenha nos favoritos, porque quero ler o livro nas férias. Sabe que eu tenho tentado pensar muito em como não cair nessa armadilha sociocultural de sempre produzir. Eu tenho uma tendencia natural a isso então é algo bem complexo pra mim. A terapia vem me ajudando muito nesse sentido. Acho que o autoconhecimento é um bom caminho. Talvez não seja o único, mas é um bom caminho.
    Obrigada pela dica.

    Um beijo,
    Fernanda Rodrigues | contato@algumasobservacoes.com
    Algumas Observações
    Projeto Escrita Criativa

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    1. Oi Fê!

      Vi sua pulicação no Twitter, fiquei muito feliz de saber que minha resenha te despertou algo. Realmente, essa pressão é uma armadilha. Queria poder dizer que não caio nela, mas estaria mentindo. Fico constantemente me cobrando fazer e produzir coisas, é difícil. Que bom que a terapia está te ajudando com isso, também estou trabalhando na minha ♥

      Se ler o livro, me fala, quero saber o que achou

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  2. Oi, Marina como vai? Que resenha informativa, adorei a forma como você conduziu os acontecimentos da obra sem ser demasiadamente exagerada. Gostei do assunto, aliás é um assunto importantíssimo nos dias de hoje não é mesmo! Presumo que a leitura valha muito para a reflexão do leitor(a). Parabéns pela sua resenha. Abraços!


    https://lucianootacianopensamentosolto.blogspot.com/

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    1. Oi Luciano!

      Obrigada <3 É um assunto importante demais, e mesmo assim muito pouco falado. Vale a pena demais a leitura

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  3. nossa vc acredita que me indicaram esse livro recentemente?! eu to maluca pra ler pq com certeza deve ter mt coisa que reflete mt da realidade da nossa sociedade atual... acredito que seja uma leitura complexa pra fazer devagar e digerindo bem a informação... adorei sua resenha

    www.tofucolorido.com.br
    www.facebook.com/blogtofucolorido

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    1. O livro é ótimo, se tiver oportunidade, leia! Tem algumas partes mais complicadas, mas lendo devagarinho dá pra entender.

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  4. Oi Marina, tudo bem?
    Não sei se é o tipo de livro que eu me arriscaria a ler, mas o tema é muito interessante. Eu mesma já me senti atingida várias vezes por não estar produzindo nada. Às vezes aquela tarde de bobeira me deixa com a impressão como se eu tivesse desperdiçando a vida. Muito louco isso. E quando estou escrevendo então? Sempre tem aquela vozinha: "tá perdendo tempo, isso não vai servir pra nada, ninguém vai ler. Vá fazer algo produtivo"... isso sem contar as vozes "não vai arranjar um emprego não?" "sai da casa dos seus pais, tá errado isso"... enfim. Queria muito silenciar essas vozes. Ignorar nem sempre é fácil. Vivemos constantemente sob uma pressão que está cada vez mais difícil de lidar.

    Até mais;
    |Mente Hipercriativa (Blog) | Mente Hipercriativa (Fanpage)|

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    1. Oi Helaina! Também sinto isso às vezes, por mais que eu já tenha feito muita coisa, sempre sinto uma pressão enorme nos meus momentos de descanso. É como se tivesse que ser produtiva 100% do tempo, o que é impossível! Aos poucos tenho confrontado isso, acho que perceber o que acontece já ajuda muito no problema. Espero que fique bem!

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  5. Fiquei meses e semanas longe de tudo e sem produzir. Tenho feito meditação, exercícios físicos, tenho tentado entender os motivos que me levam à fazer o que faço, e como produzir e estar inserida no mundo sem perder minhas motivações e meus significados.
    É simples entrar em piloto automático e seguir a rotina pra sempre, mas isso traz infelicidade.
    Não sei a receita pra não adoecer nesse sistema, mas talvez um dos ingredientes seja saber o motivo e a importância de estar fazendo certas coisas do dia-a-dia.

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    1. Oi Bruna! Saudades de você <3

      Isso também acontece comigo, entro no piloto automático e vou deixando de lado as coisas que gosto. É difícil né? Meus gostos não são exatamente o que a sociedade vê como ideial rsrs Mas a gente vai tentando equilibrar as coisas e não perder nem o que gosta nem ir viver no mato. Bom te ver por aqui!

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  6. UAU! Que lindeza de obra e de resenha! Adorei as indagações que foi deixando de modo a apresentar as entrelinhas da obra já nos fazendo questionar sobre o hoje e o mundo interno de cada um. Sua crítica se colocando tanto em seu próprio dia a dia deixou tudo ainda mais intenso e importante. Maravilhosidade!

    semquases.com

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  7. Ma, que resenha mais maravilhosa! Já tinha ouvido falar sobre o livro, mas você me trouxe uma visão ainda mais instigante e aprofundada. Fiquei super curiosa para conferir e, como autora, é algo que abordo em diversos dos meus escritos, então já tenho uma identificação que vai mexer com as minhas estruturas. Amei <3

    semquases.com

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    1. Se tiver oportunidade, leia, vai valer muito a pena, principalmente porque você já se identificou :D

      Vi que você comentou duas vezes, aí percebi que na verdade fui eu quem esqueceu de aprovar o primeiro comentário. Perdão hahahahah

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